domingo, 31 de agosto de 2025

A cultura da inclusão IV

Estamos numa fase em que se fala muito sobre inclusão social, mas pouco se vê.

Fiquei muito contente, quando me dirigi ao shopping e numa loja o senhor que estava a registar na caixa, não só era negro, o que desbrava logo o caminho das outras cores que não os caucasianos, tinha já alguma idade, o dá alguns retoques a "a partir dos quarenta esquece seres vendedor e vires para o balcão; os quarenta são o desemprego de muitas mulheres por atingirem a idade daquilo que a maquilhagem não tapa", e tinha um défice neurológico, não sei se cognitivo ou não. Trabalhava muito lentamente, mas fez tudo o que os colegas faziam, picou o preço, dobrou o produto, com alguma dificuldade mas fê-lo, perguntou se precisávamos de NIF e de saco. Concluiu a venda de forma cordial e educada, e assim passou ao cliente seguinte

Fiquei encantada por estarem a fazer a inclusão social de pessoas como este senhor, que ,embora com limitações, pode trabalhar e com mestria, com calma, com ponderação. Para ele uma venda é um ato heroico porque não sabe se os dedos vão paralisar ou não. O seu sorriso dava-lhe um ar de felicidade. De tantas desgraças que passou na vida, tinha, ao menos agora, um pouco de paz. Ganhava o seu ordenado por mérito e por justiça social.

Devia ser obrigatório incluir pessoas com diferenças da população geral. Porque elas também são pessoas, também sentem, e muitas vezes apenas por serem um pouco mais lentas são postas de lado, como se lhes faltasse competência, formação ou uma imagem agradável. Facto é que temos que passar pelo escrutínio das chefias até que elas nos digam "não se esqueça de vir maquilhada".

Devíamos estar a viver a cultura da inclusão. Não apenas com um funcionário que nos atendeu numa loja, mas em vagas que existem em tantas lojas e lugares por aí a precisar de serem preenchidas. 

Pensem nisso senhores políticos.


Bárbara de Sotto e Freire

sábado, 30 de agosto de 2025

A deficiência III

O post irá sair brevemente. 

terça-feira, 26 de agosto de 2025

A indiferença à diferença II

 Volto à carga. Volto à vida nascida da escrita. Volto porque me revolto. Volto porque é a minha essência.

E o primeiro post vai para o tema da incapacidade das empresas e escolas em darem um voto de confiança aos funcionários com qualquer tipo e grau de deficiência.


Sim, eu sou portadora de Transtorno de Personalidade Borderline. E sinto na pele a dor de ser posta de parte, a dor do cochicho, a dor de não poder estar fora de grades.

Frequentei um curso, e fui violentada, por um professor machista e incorreto .O que é que ele me fez? Em primeiro lugar não me preparou para um exame que temos no final, retendo-me a lavar e a secar cães. Afinal sou mão de obra barata: pago para trabalhar!

Sempre me disse que eu era lenta, e indisciplinada   na forma como secava os cães. Um dia, fiz um barra de 2 cm, mais ou menos, no pelo de uma cadela que lhe pertencia e ele só disse "sai da minha frente que eu não sei o que te faço"; noutra situação disse que eu só fazia asneiras e disse-me ao ouvido "ou te despachas ou fo*+'-te.

Reparou no meu tremor nas mãos e que isso seria um entrave ao exercício da profissão. Até agora sempre tosquiei sem que os ditos tremores afetassem o sentido do pelo.

Envolveu outros alunos para lhe reforçarem que eu fazia muitas asneiras.


E assim chegamos ao dia do exame com foco, força, fé, e fo*»-se.

Ao que parece o dito cujo disse à formanda, que por ele não a passava no exame. Se ela quisesse ainda podia fazer alguns melhoramentos. Assim ela fez, ao que ele disse que estava muito melhor. MAS o cão no seu conjunto não estava funcional.

Espero que Espanha tenha a noção que este senhor não tem. Sou aluna aplicada, ponderada, assídua e pontual. Nas aulas faço o que me mandam. Mas como em todo o lado, há os favoritos e os que nasceram com o cu virado para a lua. Eu acho até, que pertenço ao grupo dos que nasceram por ventosas, tal é a força de espirito que têm.

Agora vou esperar pela nota. Depois vê-se. Mas não brinquemos aos cabeleireiros, somos gente adulta a lutar por um certificado. Um merecido certificado.

(Continua)

Bárbara de Sotto e Freire

A incapacidade das empresas contratarem pessoas com deficiência I

 

Fico cada vez mais chateada e revoltada com a politiquice das empresas que dizem ser inclusivas para as pessoas com deficiência, pretendendo, até, ser um exemplo a esse nível, contratando um jovem com ligeira incapacidade física, e ao final de 4 meses dizerem-lhe que “afinal já não és preciso aqui”.

Eu mesma fui vítima do estigma social da deficiência, e ao final de 12 anos de empresa fui convidada a sair. Porquê? Porque enquanto eu dei tudo, enquanto eu superei todas as expectativas, enquanto eu era a bailarina principal, todos diziam “muito bem”, “és excelente”. Contudo, depois de uma baixa psiquiátrica de três anos, em que descobriram que eu tinha o Transtorno de Personalidade Borderline, tudo mudou. A medicação tornou-me mais lenta, muita coisa tinha mudado, quer a nível de produtos, quer a nível de software. Eu não arriscava. Não retinha os conteúdos à primeira, pelo que era considerada a chata do serviço. Ninguém percebia o que se passava comigo. O que é facto é que ainda andei assim algum tempo, mas voltei a meter baixa. De regresso ao trabalho, os tremores, o facto de me babar, o medo de errar no atendimento ao público, levaram a que me propusessem a rescisão do contrato. Puseram o médico do trabalho como intermediário. Vejam lá! Um médico que me dizia que os Recursos Humanos não estavam a gostar do meu desempenho laboral. Obrigaram-me a levar relatórios do médico de família e do psiquiatra a atestar em como eu estava apta para trabalhar. Assim o fiz. Mas com isto o medo crescia, e força para lutar numa empresa tão grande, estava a esvair-se. Por vezes via o cliente a entrar e tinha medo. Ainda não tinha abordado o cliente e já tinha suores, tremores, enfim… Os colegas não ajudaram, antes pelo contrário. Eu não estava ao nível deles. Eles davam 120% eu só dava 100%. Ninguém me estendeu a mão e me disse, algo do género: “eu estou aqui”, ou “vais para a reposição, porque é mais adequado para ti”, ou “põe uma baixa e recompõem-te, volta quando te sentires mais forte”. Nada. Só ficaram felizes quando assinei a rescisão do contrato de trabalho.

Numa empresa que se quer tornar exemplo de inclusão à deficiência.

Hoje, passados 2 meses e 27 dias lamento. Lamento não ter lutado pelo meu posto de trabalho. Ir ao advogado, levar relatórios médicos, whatever… Hoje lamento. Pelo colega que foi despedido, não porque já não era preciso, mas porque tinha uma deficiência.

Aos senhores doutores, CEO’s, quem quer que sejam, se querem ser o exemplo não vão por este caminho de mentira e inglória, porque, despedir pessoas com deficiência não é o caminho.

Pedras no caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo… (Fernando Pessoa)

 

Bárbara de Sotto e Freire