«Há um dia em que as pessoas morrem para sempre dentro de nós. Esse dia tinha chegado. O que nos torna ínfimos é a nossa incapacidade de ver. Essa cegueira disforme que nos impede de auscultar a vontade do outro, de vasculhar dentro da vontade do outro. Quando assim é, absolutamente nada nos ilumina e nem a intuição se encarrega de nos guiar. O amor nasce e morre dentro de nós quando muito bem lhe apetece. Sem aviso prévio. Sem rede. Nunca se sabe o ponto de açúcar, o momento certo para avançar no arame. A vara nas mãos, a olhar o céu, o coração suspenso. A todo o momento o arame, um risco fino, imperceptível, está e deixa de estar por baixo dos nossos pés. Tive de lhe dizer:
- É hora de ir embora.
- Nunca foste forte em despedidas. Não acredito que consigas.
- Até já.
Disse-lhe adeus e fiquei com a rigorosa sensação de que a grande mentira da minha vida tinha sido este "até já" hipócrita que se soltara da minha garganta para evitar danos maiores.
A perda. A falta. Fazer coincidir o coração com a cabeça dentro deste lugar anárquico que sou, onde nunca o coração obedece à cabeça. Consegui.»
Adopta-me
Maria João Lopo de Carvalho
Bárbara de Sotto e Freire
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