«Uma das coisas que muita gente faz no verão é ler livros.
Durante o ano, a maioria confessa que passa os olhos por jornais e revistas, que consulta obras de referência necessárias às respectivas profissões, que gasta os olhos a ler papelada de índole profissional, que vai à net como quem bebe copos de água e lê o que conhecidos, mesmo que virtuais, por ali vão deixando. Os livros, propriamente ditos, vão-se lendo devagarinho, duas páginas de cada vez, antes de adormecer ou nas "secas" programadas. Mesmo sendo verdade que "nunca" como hoje a actividade editorial teve melhores dias, o facto é que se publica por surtos "coisas" que parece que as pessoas podem querer ler. Umas vezes são uma espécie de ensaio sobre as mil e uma maneiras de ter sucesso, de manter-se eternamente saudável ou jovem, de conquistar o par ideal ou melhorar a auto-estima. Outras, a aposta vai para as receitas de poupança, de investimento, de ganhar dinheiro, de profissões de futuro ou de visões economicistas razoavelmente defendidas. Há os livros de viagem com mapas, dicas sobre hotéis, restaurantes, actividades a experimentar e sítios a conhecer. Há os livros de culinária - que está na moda -, bonitos e que fazem salivar só de olhar para as fotografias das iguarias que nunca se chegarão a confeccionar. Sempre atraente é o nicho de livros dedicados às mães que já o são ou em vias de o ser e aos problemas prováveis dos respectivos rebentos. Há, depois, os livros quase técnicos, que ensinam de forma prática e fácil aquilo que parece inacessível nos grandes e caros compêndios. Sobram as crónicas curtas de personagens minimamente conhecidos que permitem opiniões sobre assuntos banais e alguns mais etéreos, e uma espécie de literatura de moda que, actualmente, se fascina com temas góticos em versão light, em rigor com vampiros apaixonados. Dizem os especialistas que há autores que vendem apenas pelo próprio nome, mesmo sendo duvidoso que os seus livros façam mais do que enfeitar estantes.
No meio disto, causa alguma surpresa que os pouquíssimos autores que até têm histórias para contar, ainda por cima bem contadas, continuem a existir, a escrever, a vender alguns livros e a ter algum público atento que os lê todo o ano. Até no verão.»
Isabel Leal
In Caras, 29 Agosto 2009
Bárbara de Sotto e Freire