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sábado, 13 de dezembro de 2014
quinta-feira, 11 de dezembro de 2014
O meu divã de Marraquexe
Pela janela deste meu escritório, deste meu refúgio, desta minha pequena caixinha, baixo as persianas de modo que entrem apenas pequenos raios de sol, filtrados pela forma das mesmas. Lá ao fundo, bem ao fundo, o mar. Deito-me no meu pequeno sofá, com as pernas por cima do encosto, com a cabeça pousada sobre uma cadeira almofadada, e a face virada para o infinito. Ligo a minha mais recente aquisição musical – o CD de música clássica com sons de mar – na minha pequenina aparelhagem; coloco o som numa altura amena, ligo o aquecedor no mínimo... a Nina faz-me companhia.
A Nina é uma cadela que encontrei abandonada a semana passada; ainda é muito pequenina, e tem os olhos cor de avelã escura. É preta e castanha e tem um focinho que maravilha qualquer alma. Juntamente com a Mia, a gata que puseram aqui na porta de minha casa faz agora três meses, dá-me à alma a ternura de que preciso para me sentar e escrever. Ambas são fonte de carinho, de meiguice, de paz. Ainda não estão bem acostumadas uma com a outra; a gata toma conta da cadela, e assume um papel maternal, embora defenda muito o seu território, e não permita à cadela muitas brincadeiras.
Penso que se vão entender bem e num futuro próximo espero vê-las a dormirem juntas, a brincarem juntas e a fazerem-me sentir um pouco realizada.
Fecho os meus olhos perante estas réstias de sol, onde se vêm algumas partículas a pairar, e divago pela minha mente.
Vou para o meu lugar inventado, onde também eu não sou eu, mas a Bárbara... e estabeleço comigo mesma uma conversa franca e sincera, de tudo o que fui e sou, mas tudo não passa da minha imaginação, do meu lugar inventado, com a minha gente, com as pessoas que sonho, com as personagens que construo, por entre intervalos de sono.
Mas o meu lugar inventado, esse meu lugar, é de uma beleza tão idílica que se torna difícil de exprimir por palavras o que esse lugar é, para mim. As palavras tornam-se limitantes perante a magia do sonho, da ternura e das lambidelas da minha cadela, que me fazem estar entre dois mundos tão diferentes, mas igualmente reais.
Sento-me no meu divã de Marraquexe, numa varanda com soalho de madeira. A varanda é muito grande e extensa. Atrás de mim uma grande porta de correr, toda ela em vidro, por onde o ar passa e remexe as cortinas de seda fina, quase transparentes. Ainda atrás de mim algumas plantas, num canteiro com um design sui generis... ao meu lado uma pequena mesa onde repousa um livro, uma lapiseira, e um copo com algo alaranjado no seu interior. Um sumo de toranja e manga, com dois cubos de gelo. Óptimo! Do meu outro lado e um pouco atrás está o meu cavalete, com uma tela em branco. Uma pequena mesa tem os meus pincéis, as minhas tintas, os meus jarros de água, e algumas misturas de cores. Para além da varanda, de madeira cruzada, talvez de carvalho ou de cerejeira, estende-se o infinito. Uma praia deserta, de areia branca e fina, e depois, logo ali, bem perto da minha varanda inventada, o mar.
A maré está baixa e vêm-se algumas rochas que parecem flutuar sobre a leveza das águas calmas e límpidas. Não vejo mas sei que logo ali há pequenos cardumes de uns peixes pequeninos...
São parecidos a uns que eu costumava apanhar e pôr em frascos quando vinha da escola primária e, mentindo à minha mãe, fazia um atalho pela Fonte do Marau, onde me deliciava a apanhar umas plantas esquisitas de tão requintadas que eram, e uns peixinhos que não o pareciam, mas nadavam por ali... divertia-me imenso... sobretudo depois de me dar conta que tinha roubado os frascos do mel vazio que a minha mãe guardava religiosamente até à próxima colheita, e sentia os braços, curtinhos e redondos, completamente encharcados. E por momentos era criança, uma criança feliz...
As ondas são baixinhas, e o som do mar confunde-se com o ruído da minha música clássica, que soa de uma sofisticada aparelhagem com som sorround na varanda. Na minha varanda inventada, claro! Por entre um Mozart, um Bach, uma Maria João Pires, vão-se soltando as ondas e sente-se a paz do infinito.
A cozinha, com uma mesa de madeira de carvalho, grande, e com apenas dois bancos compridos, um de cada lado, daqueles que se usavam antigamente, e que a minha bisavó tinha na cozinha... e um fogão a lenha, onde de vez em quando cozo a minha fornada de pão. A um canto da cozinha há uma chaminé, também daquelas antigas, e sob ela jaz uma panela preta de três pernas, semelhante às dos filmes das bruxas, e como a da minha bisavó, da qual guardo muito boas memórias. Há uma banca de mármore, e muitos armários de madeira de estilo rústico. Do outro lado, mais junto à mesa, nasce uma parede que não esconde nada: dela emergem duas grandes janelas das quais se vêm as montanhas. O ambiente é acolhedor e colmatado pelas cortinas de linho.
Regresso à minha varanda, ao meu divã. É um divã de Marraquexe, daqueles de palhinha entrançada e com duas curvas sinuosas em ambos os topos. Sobre essa palhinha uma almofadão revestido a algodão branco pérola. Sentada no divã, com uma pele dourada e luminosa, com um chapéu de abas largas a proteger-me o rosto delicado, e um vestido solto, tento respirar a paz daquele meu cantinho inventado. Não sei onde pára a minha mente, nem o meu espírito. Estou em plena harmonia com os sons e os cheiros que me rodeiam, com o conforto que me é oferecido, e esqueço-me de mim, de tão absorta que estou nessa viagem que faço.
Está a entardecer e o sol está a pôr-se no horizonte. Levanto-me, e descalça, sigo até à varanda onde me apoio. A brisa torna-se um pouco mais forte e tenho de segurar o meu chapéu. Semicerro os olhos face ao sol que se põe. Sinto o chão sob os meus pés, a natureza ao meu redor, e diante de mim o infinito. E uma paz calma e serena - de quem concluiu tudo o que tinha a concluir, inclusive a tela branca esquecida sobre o cavalete - invade-me, fazendo-me entrar num êxtase de alma, pairar, olhar para o céu e senti-lo dentro de mim, ver o mar e reflectir o seu brilho nos meus olhos, cheirar esta beleza, e expirar paz...Está a arrefecer cada vez mais e o meu vestido esvoaça. Mas não me apercebo do frio que me aconchega a alma. Entretanto vem a Maria com um xaile de lã. Pousa-mo suavemente pelas costas, beija-me a tez, e passa-me para a mão uma caneca de chá branco, perfumado. Sorri para mim e tal como apareceu, esvai-se.
A Maria é a minha ama inventada. É aquela personagem que construí e que nunca deixará de habitar o meu imaginário. Foi uma ama boa, uma companheira estupenda na adolescência, e nunca me abandonou, seguindo sempre lado a lado comigo, dando-me conselhos de vida, com a sua experiência de mulher viúva. Permanece comigo neste meu mundo inventado.
O sol deixa de estar forte, e por isso tiro o chapéu. Bebo o chá quente que transpira o frio da brisa marítima, e pouso a caneca no chão, junto dos meus pés. Agarro-me à varanda e os sons de um piano ao fundo confundem-se com o bater das ondas. O céu fica súbita e gradualmente mais cinzento, pressagiando uma chuvada, quem sabe uma tempestade... não, não é tempestade, porque a areia que está debaixo da minha varanda está seca e mantém a sua cor pálida... quando vem tempestade ela fica húmida e um pouco mais grossa. Enquanto os meus pensamentos se debatem sobre o tempo que irá fazer durante a noite, começa a cair aquela chuva miudinha que eu tanto gosto. A intensidade da chuva vai aumentando, e o abandono o meu xaile junto à caneca do chá, e do chapéu. Salto, pela varanda, para a areia, agora húmida, e o meu vestido cola-se ao meu corpo de tão encharcada que estou. A chuva sobre a minha pele dourada confunde-se com as minhas lágrimas. Mas são lágrimas puras, que vêm de dentro de uma alma sinceramente triste... alguns sorrisos escapam dos meus lábios quando pequenos raios de sol despertam por entre os chuviscos e lá ao fundo, para além da linha do horizonte, forma-se um arco-íris. Estou encharcada, com a roupa colada ao corpo e nunca me havia sentido tão bem, tão... eu.
A Maria chama-me, preocupada: “menina, menina”. Abandono então os meus pensamentos, salto para a varanda com algum esforço, porque é realmente elevada da areia, e olho para a expressão preocupada da Maria. Já pegou em tudo o que estava ali no chão, e cobre-me com um toalhão fofo, onde me enrosco.
Ela abraça-me. Afinal sou a sua filha. Sou a filha de uma personagem estéril. Filha do mar.
“A banheira está cheia, pus os sais de banho que mais gosta, o quarto está aquecido, e vou-lhe preparar uma sopinha não vá agora ficar doente” diz-me com a sua voz meiga. “Não te preocupes comigo, Maria, já tenho idade para me cuidar”, respondo. Ouço-a a falar baixinho, mas não percebo nitidamente o que diz... mas imagino que vai a pensar alto... “se não fosse eu, o que seria de si, menina; lá tem idade para se cuidar?!, estas meninas, hoje em dia...”
Dirijo-me ao meu quarto, e vou deixando o meu rasto pois estou tão encharcada que marco tudo por onde passo. Chego ao banho e a banheira fumega; as paredes estão embaciadas, e o ambiente está ameno. Então, dispo-me, e mergulho na banheira, com a água quente a lavar-me a alma pura, com o bafo morno a sugar-me os poros do frio, e o cheiro das violetas e encharcar-me o espírito. Lá fora chove, o sol ainda não se pôs, oiço o mar, mas a Maria já desligou o meu som. Deixo-me estar nesta paz, onde as lágrimas me purificam, e o calor das águas me abraça.
Entretanto uma onda mais forte faz-me sentir que tudo isto é no meu cantinho imaginado, onde tudo não passa de sonho e fantasia, mas onde o mundo que vivo e o que sonho se fundem num só, como uma tela branca, sobre um cavalete, à espera dos traços do pintor. E os pintores da vida somos nós.
“Até logo Bárbara, durma bem” diz-me a Maria, aconchegando-me os lençóis e dando-me um beijo de boas noites.
A Maria despede-se de mim, como uma mãe. Fecho os olhos, enrosco-me nos lençóis e num edredão de penas, e tento encontrar um calor que me insone a alma, como se encontrasse naquela cama os braços de uma mãe que me aconchegam, ou os braços da minha metade, que algures paira, e que ali estariam para me proteger.
A noite chegou, e as penas deixo-as ir com a brisa, porque a alma, essa, jamais estará limpa da tristeza, como a minha tela branca, que sem estar pintada, ficou manchada pela chuva.
“Adeus Maria, dorme bem”...e na minha mente esvoaça o pensamento “quem sabe amanhã já cá não estarei para me adormecer na solidão, para receber os mimos estéreis da Maria, e para mudar a tela do cavalete. Talvez amanhã já eu própria seja mar, música, chuviscos e areia branca. Talvez..."
Bárbara de Sotto e Freire
segunda-feira, 6 de outubro de 2014
Fique Optimus com a Optimus Home!
Faz
hoje 6 anos que deixei a Optimus Home para abraçar um outro grande
desafio.
Nestes
6 anos cresci muito enquanto pessoa e profissional, aprendi muito,
assisti ao crescimento de um conceito, de uma marca, da qual me
orgulho, e que muito me apraz fazer parte.
Contudo
nunca poderia deixar de esquecer quem me viu nascer atrás de um
telefone, a vender telefones. Uma casa que me ensinou as máximas que
ainda hoje emprego, uma família que me levou longe. Digo que será
muito difícil na minha vida encontrar uma equipa tão especial como
aquela que encontrei na Optimus.
A
vida é feita de sentimentos. Não podia deixar passar o dia de hoje
sem enviar um enorme abraço para toda a família OH de há 6 anos
atrás do Call Center Ferreira Dias.
Um
abraço cheio da saudade que só os amigos, a distância e o tempo
conhecem. Um abraço repleto do espírito sincero de que era feita a
nossa equipa, da imensa humanidade que nos juntou. Até sempre.
Bárbara de Sotto e Freire
06 de Outubro de 2014
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domingo, 5 de outubro de 2014
Será que o amor acontece?
Hoje pergunto-me se realmente o amor acontece.
Foste único comigo. Acompanhaste-me às consultas, deste-me carinho, amor e proteção. Fomos viver juntos, e o nosso amor aconteceu, assim, tal qual ele era, sincero e transparente, porque para mim, tu eras a minha pessoa. Aquela pessoa especial que eu amei de forma autêntica. Aquela pessoa especial que todos os dias eu tentava compreender e me dava, de forma, original, divertida e sorridente, o seu amor.
Contudo, o tempo foi-nos desgastando.
O facto de termos alguns gostos diferentes levou-nos a estar cada vez mais afastados um do outro. Eu penso que foi isso. Julgo que foi o facto de tu gostares de voar com os teus aviões telecomandados, e de eu gostar de estar em casa, a ver televisão, com uma manta e uma caneca de chá, entre muitas outras diferenças que eu poderia apontar, que nos levou a discussões que se tornaram cada vez mais acesas, cada vez mais frequentes, cada vez mais dolorosas. A certa altura senti-me incompreendida, sabes? Não conseguia perceber a tua distância. A distância do homem que eu amava. E isso ainda me fazia sofrer mais dentro do meu sofrimento. Não consigo pôr-me no teu papel e fazer de mim o meu namorado… sei que é isso que tu, que me estás a ler, neste momento, me pedes. Mas não consigo inverter os papéis. Quando tento acho sempre que teria uma postura mais compreensiva e não tão fria. Eu que no início deste relacionamento achava que era a voz do ser racional e que não deixava falar o coração! Consegues ver o quanto me mudas-te? Eu amei-te de forma tão intensa, tão intrínseca, tão mágica e única, entreguei-me a nós como se o nós fosse a razão da minha existência, e aprendi tanto! Mas sabes, sofri muito também.
Em Novembro a nossa relação foi à rutura. Quiseste que eu saísse de casa e a minha mãe não me deixou voltar à casa dela. Aí achei que o mundo estava do avesso. Só me questionava porquê? Porque é que o Afonso me está a causar tanto sofrimento? Porque é que a minha mãe não me aceita de volta? Qual o motivo de uma história de amor acabar assim?
Chorei todos os dias por ti. Todos os dias te liguei a suplicar uma nova oportunidade para nós. Mas tu, Afonso, estavas irredutível. Tentei, por tudo, que os teus olhos, são lindos os teus olhos, se voltassem para mim, e só algumas semanas depois tu me deste a possibilidade de falar contigo pessoalmente.
Tentamos de novo viver juntos. Mas no mesmo dia em que me mudo para tua casa, tu dizes-me que não estás para me aturar.
Essas foram, até hoje, as palavras que mais me doeram, que mais me feriram a alma. Por mais que lave a minha memória, não consigo esquecer estas tuas palavras. Nem tudo o que te disse foi justo, muito longe disso. Mas jamais disse algo de tão grave que ficasse gravado na tua memória, como "aquelas palavras terríveis", como "as palavras que quando lembro tenho de fechar os olhos para não doer tanto".
Não me querias aturar?! Eu também não. Eu só queria estar contigo. Partilhar a felicidade dos meus dias com o príncipe que encontrara, livrar-me da infelicidade ao lado da minha pessoa, construir algo de que me orgulhasse ao olhar para trás, sempre contigo.
De facto depois disso ainda conversamos, mas a determinada altura eu não quis mais a minha pessoa para mim. A relação estava a ser muito conturbada, estava a prejudicar-me como nestes últimos meses. Eu queria alguma estabilidade, e era tudo o que eu não tinha contigo. Em Janeiro despedi-me de ti.
Mas nunca me esqueci do homem fantástico que és, da pessoa maravilhosa com quem partilhei momentos únicos e inesquecíveis.
Nunca me esqueci do teu pequeno-almoço, das tuas chamadas, do facto de me chamares "meu amor"… Nunca me esqueci do toque das mãos, nem do teu cheiro. Neste tempo que passou, jamais me esqueci de ti Afonso. Vou levar-te comigo para onde quer que eu vá.
Guardo memórias fantásticas do tempo que passamos juntos. Adorei atirar-te à neve, Amei a primeira viagem que fizemos juntos. Tu lembras-te?! E Porto Antigo? Foram dos dias mais especiais que tive… Tenho saudades dos teus cozinhados. Quero que saibas que ficas-te guardado num lugar bem especial.
Hoje desvinculei-me de ti. Há tempo de mais que chorava pelos cantos, que sonhava contigo, que me perguntava pelo meu Afonso, sabendo que já não eras meu, que nunca tinhas sido meu, mas alguém que tinha dado uma nova luz à minha vida. Hoje decidi reaver a minha energia projectada em ti e voltar ao meu caminho.
Não é solução viver enlutada por um homem vivo. Acho, sentidamente, que mereces ser feliz. E eu também. Guardo dentro de mim o Afonso minha pessoa. Brilha por onde fores. Para onde fores. Por onde o tempo te levar.
Bárbara de Sotto e Freire
04 de Outubro de 2014
sábado, 16 de junho de 2012
Cari amici...
Cari amici,
Já tinha saudades da viagem solitária que a escrita me proporciona. Saudades dos momentos de reflexão e desabafo. Ao longo destes meses em que não escrevi senti falta da caneta e do toque do papel. Senti a falta do som das teclas que outrora os meus dedos dedilhavam tão ou mais rápido que o meu pensamento. Durante esta ausência escrevi textos no meu pensamento mas não os conseguia transpor para um plano visível e palpável e isso deixou-me frustrada muitas vezes. Outras vezes quase me obriguei a escrever, mas acabei por apagar as palavras que saíram dos meus dedos, que saíam do lado mais racional desta minha cabeça complicada. Outras vezes fiquei a olhar para o ecrã branco e pensei "o que se passa comigo?". Vezes havia em que queria escrever, mas por razões profissionais, ou por outras obrigações, não o podia fazer. Mas ao longo da última semana, foi como se a necessidade de escrever fosse crescendo e as ideias fossem brotando, e enfim, cá estou eu, a escrever, furiosamente, a teclar, cheia de entusiasmo, e sorrindo, contra um ecrã que se enche, repleto de palavras, de sentimentos e emoções, de histórias.
In definitiva...
Ao longo destes meses de ausência a vida não foi particularmente afável comigo. Aprendi que as pessoas são inconstantes, encontrei mais pessoas escorregadias do que aquelas que esperei encontrar ao longo de toda a minha existência, aprendi que a vida não é preto no branco (acho que ainda não aprendi, mas é uma constatação cada vez mais frequente), e que há pessoas que merecem apenas um cartão de saída da minha vida sem qualquer V de volta. Ao longo destes meses despedi-me de muitas pessoas. Sem mais nem menos, as pessoas vão. Morrem, vão quando menos se espera, mudam de emprego, mudam de local de residência, mudam de local de trabalho. As pessoas que consideramos serem fundamentais para as nossas vidas terem algum equilíbrio vão. Aquelas pessoas a quem nós damos tudo para ficarem, a quem nós alimentamos a presença, a quem nunca daríamos razões para nos darem um bilhete de saída, ou a quem nunca daríamos um bilhete apenas de ida. A vida é controversa e amarga.
Non capisco!
Neste espaço de tempo foi Outono, foi Inverno, é Primavera, e quase Verão.
Contudo o tempo permanece incerto.
Dediquei-me a aprender as plantas, a ciência do seu uso. Fiz sacrifícios imensos para me tornar uma melhor profissional. Sacrifiquei horas dos meus dias e dias dos meus anos para ter as minhas tarefas laborais prontas a tempo e horas, com o mínimo de lapsos possíveis, com o maior brio e dedicação.
Até agora sinto uma coisa estranha... Trabalhamos para ser reconhecidos?
Naturalmente.
Ao longo destes meses, fiquei mais velha. Tenho brancas. Tenho rugas, olho para o espelho e vejo-me a envelhecer. Só me pergunto e me questiono acerca do que conquistei até hoje, até agora.
Pergunto-me se conquistei corações, se conquistei sorrisos, se serei importante para alguém ou para muita gente, se deixarei saudades. Pergunto-me até que ponto fui importante para o mundo.
Apaixonei-me e desapaixonei-me. Fiquei com raiva e depois fiz as pazes comigo mesma. Hoje acho que nem sequer me apaixonei. Raios partam o coração e as leis da atração ou lá o que isso é.
E foi assim, um devaneio de emoções, um afogar no trabalho para não ter que pensar no resto. Um resto que por vezes não há. Uma falha emocional grave. Foi assim. Desviar o emocional para o racional, para esquecer o que falta.
Que faltas lá tu no almoço de Domingo, que faltas lá tu ao telefone, que faltas lá tu com o teu sorriso, que faltas lá tu, qual pit bull, que faltam lá todos vocês.
Faltam lá todos vocês. Por isso estou imersa em mim.
Mi manca la tua presenza.
Voglio Dom.
Bárbara de Sotto e Freire
quinta-feira, 1 de outubro de 2009
Razão para vivê-la
Por vezes queremos que a vida pare. Queremos emoldurar momentos, sentimentos, pessoas. Queremos perpetuar numa imagem muito nossa o sorriso, um elogio, um olhar. Por vezes quero que o tempo volte para atrás para amar até ao limite, odiar no limiar da resistência, sentir no mais profundo do sentimento. Impossível voltar atrás, mas também dificil de andar adiante, por não nos termos exultado até à maior perfeição de sentir. Então restam-nos essas maravilhosas fotografias, onde criopreservamos o nosso futuro emocional. Imagens de momentos, de sorrisos, de silêncio. Momentos de aplausos pendurados no tempo, que nos perseguem incessantemente. Silêncios desencontrados, como notas soltas, num mundo que construímos diariamente. E é nesse limite, em que o presente se toca com ontem, em que os átomos enaltecem a cor do pôr-do-sol, em que a utopia é realidade, que a vida nos dá razão para vivê-la.
Bárbara de Sotto e Freire
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No fundo da alma
quarta-feira, 12 de agosto de 2009
Ás vezes
Ás vezes choramos sem razão. Ás vezes choramos com uma dor de alma profunda, como se a nossa alma só conhecesse um lado.
Ás vezes os dias correm mal.
Ás vezes sentimo-nos perdidos, sozinhos, nostálgicos.
Não suportamos ver ninguém, muito menos a nossa imagem no espelho.
Ás vezes não nos apercebemos do quanto as pessoas nos ferem, nos magoam, nos decepcionam. Quando muito, não nos damos conta, do quanto nos podemos decepcionar a nós mesmos.
Ás vezes os dias passam rápido.
Ás vezes não tomamos as decisões certas, no tempo devido.
Não amamos na mesma medida.
Ás vezes amamos tanto, que ficamos vazios.
Ás vezes sentimos que a nossa vida é feita apenas de despedidas, sem ter sido possível, alguma vez, gravar nos olhos da alma, os olhos de quem vai.
Ás vezes não gozamos o momento, não sorrimos genuinamente.
Ás vezes queremos mimo.
Ás vezes nem a carapaça da indiferença nos permite resistir aos mais afiados aguilhões.
Ás vezes é mais fácil enfiar a cabeça na areia, porque temos medo do desconhecido, temos medo de falhar. Falhar com os nossos sonhos e promessas de outrora. Ás vezes somos a nossa própria desilusão.
Ás vezes tornámo-nos os melhores. Ou os piores.
Ás vezes achamos que a vida só nos coloca obstáculos.
Ás vezes não somos suficientemente inocentes para acreditar na vida, e somos levianamente perspicazes levados a acreditar que alguém, um dia, nos poderá entender.
Bárbara de Sotto e Freire
terça-feira, 12 de maio de 2009
O Mostrengo
«O mostrengo que está no fim do mar
Na noite de breu ergueu-se a voar;
À roda da nau voou três vezes,
Voou três vezes a chiar,
E disse: "Quem é que ousou entrar
Nas minhas cavernas que não desvendo
Meus tectos negros do fim do mundo?"
E o homem do leme disse, tremendo:
"El-Rei D. João Segundo!"
"De quem são as velas onde me roço?
De quem as quilhas que vejo e ouço?"
Disse o mostrengo e rodou três vezes,
Três vezes rodou imundo e grosso.
"Quem vem poder o que só eu posso,
Que moro onde nunca ninguém me visse
E escorro os medos do mar sem fundo?"
E o homem do leme tremeu, e disse:
"El-Rei D. João Segundo!"
Tês vezes do leme as mãos ergueu,
Tês vezes ao leme as repreendeu,
E disse no fim de tremer três vezes:
"Aqui ao leme sou mais do que eu:
Sou um povo que quer o mar que é teu;
E mais que o mostengo que minh'alma teme
E roda nas trevas da fim do mundo
Manda a vontade que me ata ao leme,
De El-Rei D. João Segundo!"»
Fernando Pessoa
Mensagem, 1934
Bárbara de Sotto e Freire
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segunda-feira, 11 de maio de 2009
Fundo do mar

«No fundo do mar há brancos pavores,
Onde as plantas são animais
E os animais são flores.
Mundo silencioso que não atinge
A agitação das ondas.
Abrem-se rindo conchas redondas,
Baloiça o cavalo-marinho.
Um polvo avança
No desalinho
Dos seus mil braços,
Uma flor dança,
Sem ruído vibram os espaços.
Sobre a areia o tempo poisa
Leve como um lenço.
Mas por mais bela que seja cada coisa
Tem um monstro em si suspenso.»
Onde as plantas são animais
E os animais são flores.
Mundo silencioso que não atinge
A agitação das ondas.
Abrem-se rindo conchas redondas,
Baloiça o cavalo-marinho.
Um polvo avança
No desalinho
Dos seus mil braços,
Uma flor dança,
Sem ruído vibram os espaços.
Sobre a areia o tempo poisa
Leve como um lenço.
Mas por mais bela que seja cada coisa
Tem um monstro em si suspenso.»
Sophia de Mello Breyner Andresen
Obra Poética I
Poema retirado de: http://sol.sapo.pt/blogs/underwater
Imagem retirada de: http://marlonpalmas.wordpress.com
Bárbara de Sotto e Freire
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